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Reforma Trabalhista e Saúde do Trabalhador

Resumo: A Reforma trabalhista adveio, inicialmente, com o desígnio de suprir necessidades, em face da globalização e da crescente competitividade, com o condão de crescimento para todos. Porém, ao acobertar as necessidades empresariais de poucos, acabou por desproteger direitos sociais, acarretando a precarização dos serviços de saúde, bem como causando diversos impactos negativos de curto, médio e longo prazo, no que tange à saúde de toda a população. O artigo tem como principal objetivo revelar os impactos negativos, a partir do desenvolvimento de pesquisas com base em levantamentos bibliográficos, de fontes qualitativas e quantitativas. Conclui-se que, alguns pontos da reforma sofrem severas críticas, que apontam a sua ilegalidade, o que poderá futuramente refletir na supressão de artigos e pontos declarados inconstitucionais da Lei nº 13.467/17, por meio da ação do Ministério Público do Trabalho e por pressão de organismos internacionais como a OIT – Organização Internacional do Trabalho.

Introdução

A Lei nº 13.467/2017, denominada Nova Reforma Trabalhista, supondo um crescimento para todos e uma suposta ferramenta de criação de novos postos de trabalho, ocorreu em crescente onda de globalização e competitividade.

Suas principais modificações trouxeram mudanças significativas e diminuição de direitos, tendo por escopo o arrefecimento de despesas para os empresários. Assim, a nova legislação gerou impactos negativos de curto, médio e longo prazo, atingindo a saúde do trabalhador.

Souto (2017) destaca que foram alterados 201 aspectos do arcabouço legal, que decompuseram elementos centrais da relação de trabalho e das instituições responsáveis pela normatização e execução das relações de emprego.

A análise mais apurada da matéria nos revela as implicações da reforma no âmbito das relações de trabalho no Brasil, assim como a crescente tendência da flexibilização de direitos e a diminuição do espectro de proteção dos direitos sociais, segundo preleciona Lacaz (2019).

Realizada uma revisão bibliográfica sobre o tema proposto, nas principais revistas acadêmicas e científicas disponíveis on-line e impresso, comparando as diferentes posições doutrinárias, destacando os elementos centrais encontrados nos mananciais de consulta. De tal modo que se desenvolveu a correlata pesquisa acerca da Reforma Trabalhista, cujo objeto principal foi a análise dos direitos suprimidos que atingiram negativamente a saúde do trabalhador.

Contexto Histórico

Os resultados aqui são a demonstração histórica que ocorreram avanços nas sociedades urbano-industriais capitalistas que procederam em direitos sociais marcantes, preleciona Franco (2017), durante a Era de Ouro nos EUA, entre 1940 e 1970, e durante o Estado de Bem-Estar Social nos países europeus, entre 1950 e 1970 (HOBSBAWN, 1995).

No Brasil sua principal contribuição sobreveio da Era Vargas, com a Consolidação das Leis do Trabalho, seus desenvolvimentos posteriores e a Constituição de 1988. Com o passar dos anos, ocorreram inserções sociais de segmentos de trabalhadores em todos estes países, em maior ou menor grau, bem como transformações nos modos das relações capital/trabalho. Porém, ao analisar o momento presente, constatamos retrocessos sociais enormes em relação às três décadas que se antecederam, resultando na crescente precarização do trabalho, conforme preconiza Franco (2017).

As relativizações da Reforma Trabalhista, e as leis e decretos que a sucederam, trouxeram a diminuição de proteção ao trabalhador (desproteção do trabalhador), com consequências para a saúde e a medicina do trabalho. Assim, segundo o Dieese – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (2018), os trabalhadores autônomos que assumiram esta forma de trabalho, depois da crise, tiveram que enfrentar trabalhos menos protegidos, em postos menos qualificados, e com remunerações 33% abaixo da recebida por aqueles que estavam há mais tempo nessa posição na ocupação. Isso reflete diretamente na saúde do trabalhador, deixando as pessoas mais ansiosas, com maiores dificuldades, agravando problemas de saúde, decorrentes da intensificação do tempo de trabalho e do esgotamento psicofísico.

Silva (2019) preleciona que, o inciso XVII do art. 611-B da CLT, trouxe alterações que prejudicam a saúde do trabalhador, assinalando a ilicitude da supressão ou redução de direitos contidos nas “normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho” BRASIL (2017). Ainda nesse sentido, salienta o doutrinador que no parágrafo único do referido artigo, ocorreu outra modificação inconstitucional, qual seja: “Regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho para os fins do disposto neste artigo”. (BRASIL, 2017).

Esta modificação, destaca Dallari (2004), fere o direito à saúde como um direito fundamental da pessoa humana e, no mesmo sentido, Berlinguer (1983) acrescenta a importância de a pessoa estar sujeita às condições adequadas de trabalho, nas quais se inserem a gestão do tempo de trabalho (horários, ritmos e turnos) como fatores que refletem diretamente na saúde do trabalhador.

Aspectos da Discussão Trabalho e Saúde

O trabalho, como meio de vida e de garantia da subsistência deve estar fundado na dignidade da pessoa. Assim, poderia haver o conforto de que o esforço/sofrimento no trabalho fosse acalentado pelos avanços tecnológicos e do conhecimento científico. Porém, o que se tem observado é o afastamento crescente entre as práticas organizacionais e os direitos sociais. É o contrassenso que encerra o trabalho hodierno: seu ajuste com precarização social, com adoecimento dos indivíduos e destruição ambiental, segundo Franco (2010).

Franco (2010) reflete sobre o tema e conduz a indagações instigantes e inevitáveis, dividindo em três binômios, sendo estes: 1 – o trabalho e o adoecimento, tratando-se de um problema de saúde pública e não individual, atingindo os trabalhadores em escala crescente; 2 – o trabalho e a degradação/crise ambiental, apresentando padrões de produção e consumo que rompem com os limites do tempo (comprometendo futuras gerações), de espaço (destruindo e contaminando populações e biodiversidade), devastando o planeta; 3 – o trabalho e a precarização social, comprometendo gerações, destituindo-os de educação e trabalho digno, produzindo violência social.

Com tantos avanços da ciência e da tecnologia, por que não ocorre ampliação do emprego e inclusão social? Por que o aumento de produtividade não se traduziu em diminuição das jornadas de trabalho, sem prejuízo do salário? Questiona Franco (2010).

A Reforma Trabalhista atinge, primeiramente, os trabalhadores, com a supressão de seus direitos dentre eles, segundo Lacaz (2019): contratações precárias, jornadas extensas e extenuantes, diminuição da remuneração, más condições de trabalho, enfraquecimento de organizações sindicais e instituições públicas do trabalho etc.

Souto (2017), professor de direito da USP, destaca em seu blog, que ocorreram 201 modificações de direitos na Reforma Trabalhista.

As mudanças centrais são: a diferenciação de jornada, no que tange às horas trabalhadas, antes de 8 horas/dia, com possibilidade de 2 horas extras (HE) e duração de 44 h/semana, alterada para 12 até 14h/dia, sem contraprestação de HE, durando 48 h/semana; maior rotatividade, exigência de metas, estímulo à concorrência, minando a solidariedade nos ambientes de trabalho. Tais mudanças têm sido associadas ao aumento de problemas de saúde mental e de assédio moral, segundo Lacaz (2019).

Lacaz (2019) ainda acrescenta que a modificação acerca do trabalho da mulher grávida, que era vedado em local de trabalho insalubre, com a nova lei é permitido, mediante atestado médico que o autorize, prejudicando a saúde da gestante e do nascituro.

A Lei nº 13.467/2017, trouxe a possibilidade de terceirização de todas as atividades, sendo este um dos pontos mais traumáticos na diminuição de direitos. A nova dinâmica acarreta queda do nível salarial, pois terceirizados ganham salários menores, têm jornadas de trabalho mais longas, menor estabilidade e menos direitos, conforme preconiza Lacaz (2019), destacando ser este o aspecto mais perverso da Reforma.

A terceirização, segundo Franco (2017), é uma das basilares formas de flexibilização do trabalho através da cessão da atividade de um “primeiro” para um “terceiro”, liberando, assim, o grande capital dos encargos e direitos trabalhistas. No aspecto da sociologia do trabalho, trata-se de uma forma insolúvel de superioridade e uma prática de gestão que invalida a regulação do mercado de trabalho. A terceirização lança um manto do desconhecido sobre o trabalho real, escondendo a relação capital/trabalho e descaracterizando o vínculo empregado/empregador que regula o direito trabalhista, mediante a cessão de responsabilidades de gestão e de custos para um “terceiro”. A Reforma veio para agravar a situação, pois qualquer relação agora pode ser terceirizada, não somente a atividade meio mas, até mesmo, a atividade fim, acobertando desrespeitos ao direito do trabalhador, que ficou mais vulnerável.

Corrobora Krein (2018), reafirmando que com abertura de terceirização inclusive em atividade fim, os trabalhadores terceirizados ganham menos, têm jornadas de trabalho mais extensas, menos estabilidade, com maior chance de ocorrerem acidentes de trabalho.

Belchior (2018), em seu estudo sistemático, com estudo de casos e análise quantitativa e de campo, também conclui reverberando que os terceirizados, até possuem uma chance menor de incidirem em acidentes, porém aqueles sofridos são mais graves, o que piorou em muito a realidade. Desta forma, no que tange à saúde e segurança do trabalhador a nova Lei trouxe mais prejuízos do que os benefícios inicialmente conjecturados.

No serviço público revela-se cada vez mais nítido que a terceirização trouxe a precariedade, com destaque para a queda de rendimento do trabalho, atingindo quem precisa do serviço, especialmente em autarquias como o INSS, em serviços como o SUS, bem como nos órgãos da justiça.

Com a desvalorização do servidor público, conforme preleciona Lacaz (2019), ao incluir no quadro de prestadores de serviço público trabalhadores sem o preparo necessário tanto para atender ao público quanto para lidar com os sistemas extensos e complexos, o que reflete no agravamento da ineficiência do serviço público.

A supressão de direitos relativizou-os, eis que eram indisponíveis e irrenunciáveis, permitindo a exploração e espoliação do trabalhador hipossuficiente.

Por várias razões, as taxas de desemprego aumentam, e, com o acréscimo da informalidade, o Estado diminui a sua arrecadação, tornando cada vez mais difícil garantir os direitos sociais fundamentais.

Ademais, segundo o Dieese (2018), com a crise e o desemprego, aumentou o número de pessoas buscando alternativa no trabalho autônomo. Em 2017, aproximadamente 23 milhões de pessoas estavam nessa situação e desses, 5 milhões (23%) tinham se tornado autônomos há menos de 2 anos, conforme os dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A pesquisa demonstra que aqueles trabalhadores que se arriscaram neste caminho, depois da crise, tinham proventos 33% menores do que os que já estavam há mais tempo nesse tipo de ofício.

Outro dado importante da pesquisa do Dieese (2018) revela que há diferenças enormes entre trabalhadores por conta própria também por cor/raça e sexo, conforme abaixo destacado na Tabela 1. Por exemplo, a mulher não negra, que era por conta própria há menos de 2 anos, recebia, em média, apenas 59% daquela com as mesmas características e que estava há mais tempo nesse tipo de ofício.

Analisando apenas o trabalhador por conta própria com até dois anos, os
homens não negros tinham rendimento médio mais alto (R$ 1.637,00); as mulheres não-negras ganhavam 31% menos que eles; os homens negros, 36%; e as mulheres negras, apenas a metade do recebido por esta categoria.

O Dieese conclui em sua análise que dentre os que trabalhavam como autônomos há menos de dois anos:

  • 77% não possuíam CNPJ nem contribuíam para a Previdência Social, percentual maior do que dos autônomos que estavam há mais tempo nessa situação;
  • menos de 9% possuíam CNPJ e contribuíam para a Previdência Social ( o microempreendedor individual, por exemplo);
  • cerca de 10% contribuíam com a Previdência Social, mesmo sem CNPJ, o que garante pelo menos uma certa proteção social (como auxílio-acidente, licença maternidade/paternidade etc.), percentual também menor se comparado àqueles que estavam há mais tempo (19%) nessa situação

Assim, o órgão conclui que o autônomo da crise submeteu-se a trabalhos com menor proteção social, menos qualificados e com menor remuneração.

Ainda segundo levantamento do Dieese (2018), dentre os setores de atividades nas quais mais atuavam os autônomos, destacam-se: comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas (4,8 milhões), agropecuária (3,8 milhões), construção (3,6 milhões), informação e comunicação (2,0 milhões). E com a crise econômica houve uma aceleração da entrada dos trabalhadores autônomos nos setores de alojamento e alimentação (34%), transporte e armazenagem (28%) e comércio e reparação de veículos (28%), conforme Tabela 3.

Portanto, ao contrário da ideia difundida do “empreendedor” que deixa de ser assalariado para se tornar “chefe de si mesmo”, a maioria dos trabalhadores por conta própria (52%) encontram-se em “ocupações elementares” (faxineiros, pedreiros, preparadores de comidas rápidas etc.), permanecendo com baixos rendimentos. Isso nos deixa claro a dificuldade de empreender “com sucesso”, sobretudo, em contexto de grave crise econômica iniciada em 2014 (ver Boletim de Conjuntura nº 15, do DIEESE). Desta forma, o trabalhador que passou a atuar como autônomo nos dois últimos anos seguiu, como regra, um caminho muito mais árduo, confrontando-se com a situação de trabalho incerto.

Araujo (2017) salienta que a disparidade de forças pode ser observada, por exemplo, na premência de disponibilidade do indivíduo para se sujeitar às reivindicações despóticas do emprego, bem como para dedicar tempo e esforço para aprender as peculiaridades de uma definida função sem, contudo, ter qualquer segurança de que não será despedido sem qualquer motivo, uma vez que, de acordo com a lógica da flexibilização, o trabalhador é naturalmente substituível por obreiro diverso. Ademais, recai somente sobre o empregado a responsabilidade por sua empregabilidade, por sua continuidade no emprego e pelo seu êxito no trabalho.

Assim, a nova legislação, ao acobertar as necessidades empresariais de poucos, acabou por desproteger direitos sociais básicos da grande maioria dos trabalhadores, desequilibrando a relação capital x saúde e qualidade de vida do trabalhador.

Salienta-se que não se trata apenas da saúde individual, mas também da saúde pública, consoante preconiza Galvão (2017), que propõe um debate social amplo do problema, pois construir uma nação mais vulnerável a adoecimentos não só é indesejável do ponto de vista humanitário, como também sob o prisma do orçamento público.

Conforme preleciona Galvão (2017) a desorganização da vida social e profissional do trabalhador pode desencadear doenças psíquicas, constituindo uma questão de saúde pública.

Hallqvist (1998) assinala os riscos de hipertensão arterial e doença coronariana, conectados pela pressão temporal em profissionais submetidos de forma permanente ao work-stress, entre outras doenças que atingem o organismo pela via psicossomática, nas quais o estresse persistente desempenha papel proeminente.

Lacaz (2019) também preconiza que o encargo pelo adoecimento do trabalhador que deveria ser suportado pelos empresários, devido à precarização do trabalho, será sustentado por toda a sociedade.

A OIT- Organização Internacional do Trabalho compilou dados de 1990 até 2007 (INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION, 2008) que resume o processo de precarização do trabalho, conforme o Quadro 1. A taxa de desemprego no mundo era de 5,7%, com 179,5 milhões de desempregados, em 2007. De acordo com as avaliações para 2008, estas prediziam 190,2 milhões de desempregados, ou seja, um acréscimo de 10,7 milhões de pessoas em situação de desemprego. Já nos cenários oferecidos pela OIT, as estimativas para o ano de 2009 assinalavam para 230 milhões de desempregados mundialmente, a partir da propagação e da mundialização da crise financeira iniciada nos EUA, portanto, houve um acréscimo de 40 milhões em relação ao ano de 2008, segundo Franco (2017).

Dessa maneira, a OIT em estudo de 2009, ponderou que a “[…] crise do emprego está longe de ser superada” (p. vii, tradução livre), conforme preleciona Franco (2017). Assim, entre outubro de 2008 e o final de 2009, início da crise, nos 51 países com dados disponíveis, foram perdidas 20 milhões de colocações de trabalho formal e 5 milhões de trabalhadores se encontravam numa situação muito vulnerável, inclusive, com ameaça de perder o emprego. Além disso, avalia-se que 45 milhões de trabalhadores ainda correm risco de ficar fora do mercado de trabalho, notadamente no caso de pessoas com menos estudos, além dos imigrantes, dos jovens e dos mais velhos.

Assim nota-se que na América Latina, com base no relatório da OIT, a situação já é muito grave, conforme demonstra o Quadro 2.

O Ministério Público do Trabalho tem defendido a inconstitucionalidade de vários dispositivos da Lei, inclusive, emergindo um movimento que defende o descumprimento de cláusulas da nova lei trabalhista com base em convenções internacionais do trabalho já ratificadas pelo Brasil. Com isso, provavelmente, haverá uma querela jurídica sobre a aplicação das alterações consentidas pela lei, o que pode transformar substancialmente a construção jurisprudencial, segundo Krein (2018).

Assunção -Matos (2016) preleciona que, ao analisar uma sociedade dividida por trabalhadores e capitalistas, devemos conjecturar também sobre as incongruências existentes entre trabalho e capital. Assim, a busca por soluções “mais humanas” é fundamental para a mitigação dos conflitos no mundo do trabalho.

Considerações Finais

Historicamente, houve avanços nas sociedades urbano-industriais capitalistas que emanaram diretos sociais marcantes, na Era do Ouro dos EUA, entre 1940 e 1970, e durante o Estado do Bem-Estar Social nos países Europeus entre 1950 e 1970. No Brasil a contribuição mais marcante sobreveio na Era Vargas com a Consolidação das Leis do Trabalho, e, os Direitos Sociais na Constituição de 1988.

Porém, a Nova Reforma Trabalhista, lei 13.467/17, e, as leis e decretos que a sucederam, relativizaram e trouxeram a diminuição da proteção do Trabalhador com consequências para a saúde e medicina do trabalho. Assim, segundo o Dieese – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (2018), após a crise, os trabalhadores tiveram que se submeter a trabalhos menos protegidos, refletindo diretamente na saúde do trabalhador, causando ansiedade, intensificação do trabalho e esgotamento psicofísico.

A desproteção ao trabalhador fora legalizada, retirando direitos contidos nas normas de saúde, higiene e segurança do trabalho, previstas em lei e normas regulamentadoras da Constituição Federal, tais como as regras sobre duração do trabalho e intervalos.

A modificação fere o direito à saúde como um direito fundamental da pessoa humana, sendo que as normas de gestão do tempo do trabalho refletem diretamente na saúde do trabalhador.

Os avanços tecnológicos e do conhecimento científico deveriam vir para dar conforto, como meio de vida e de conquista de dignidade, porém há, cada vez mais, enfrentamento das práticas organizacionais frente aos direitos sociais com total contrassenso, trazendo precarização social e adoecimento do indivíduo.

Tanto avanço para não haver melhora nas condições de emprego e na vida do empregado; tanto aumento de produtividade, sem diminuição de jornada e, ainda, com prejuízo ao salário.

A Reforma atinge diretamente os trabalhadores com a supressão de seus direitos como um todo, havendo contratações precárias, podendo haver jornadas extensas e extenuantes, diminuição da remuneração, más condições de trabalho, enfraquecimento de organizações sindicais e instituições públicas do trabalho.

Até mesmo a mulher grávida foi prejudicada, a qual mediante atestado médico autorizador, agora ficou mais difícil não se submeter a trabalhos insalubres, prejudicando sua saúde e de seu nascituro.

Mais ainda, o ponto mais nevrálgico da Reforma, foi no que tange à terceirização, não somente das atividades meio, mas agora também das atividades fim, sabendo-se que o terceirizado fica descoberto de garantias, trabalhando mais, ganhando menos, com menor estabilidade e menos direitos.

A terceirização libera o grande capital dos encargos e direitos trabalhistas, do ponto de vista da sociologia do trabalho, trata-se de uma forma insolúvel de superioridade, e uma prática de gestão que invalida a regulação do mercado de trabalho. A terceirização acoberta o trabalho real, descaracterizando o vínculo e cedendo a responsabilidade de gestão para um terceiro, tornando ainda mais hipossuficiente o trabalhador.

Os terceirizados até possuem uma chance menor de incidirem em acidentes de trabalho, porém, os sofridos, são muito mais graves, o que não alivia em nada a realidade, somente piorando as estatísticas em desfavor do trabalhador.

A terceirização, inclusive, pode prejudicar, e precarizar, até mesmo o serviço público, com a queda do rendimento do trabalho, além de prejuízos a toda a população atendida.

A supressão de direitos chocou-se com aqueles conquistados arduamentenos últimos 100 anos.

A taxa de desemprego só tem aumentado, e, com o acréscimo de autônomos, só eleva a precarização do trabalho destes. Assim, comparativamente, nos últimos dois anos, aqueles que se submetem a este trabalho, enfrentam a diminuição dos seus rendimentos, menor proteção social e são menos qualificados, em comparação àqueles que já estavam na informalidade antes destes 2 anos.

Assim a ideia difundida de empreendedor, de chefe de si mesmo, cai por terra, pois estes, na realidade, ocupam atividades mais elementares, tais como faxineiros, pedreiros, seguindo um caminho muito mais árduo, confrontando-se com situação de trabalho incerto.

Houve uma mudança de padrão para o imediatismo capital, mesmo este último sendo necessário, porém o equilíbrio da relação capital x saúde e qualidade de vida do indivíduo deve ser o ponto principal das políticas públicas.

A insegurança de ser substituível leva-o a condenação deste como único responsável por sua empregabilidade, por sua sequência no emprego, esquecendose que há a continuidade de sua posição de hipossuficiência na relação de trabalho, gerando mais violência e mão de obra precarizada.

Trata-se de uma questão prejudicial à saúde pública, sendo que seus malefícios devem ensejar um grande debate na sociedade, pois o adoecimento, além de ser desumano, afeta inclusive o orçamento público.

Há ainda a constatação de aumento nos riscos de hipertensão arterial e doenças coronarianas, conectadas ao crescente e contínuo esforço, dentre outras doenças psicossomáticas, desencadeando um estresse permanente, de encontro à habilidade adaptativa do ser humano.

O encargo pelo adoecimento devido á precarização, que deveria ser do empresário, será adquirido por toda a sociedade.

A OIT traz relatório conclusivo de que na América Latina a situação é muito grave.

Assim, o MPT – Ministério Público do Trabalho tem defendido a inconstitucionalidade de vários aspectos da reforma, inclusive descumprimento de acordos internacionais já sancionados.

Neste cenário, espera-se que haja alteração substancial da construção jurisprudencial, com mais estudos e enfrentamento dos conflitos contra a saúde diante da reforma, ante as nítidas inconstitucionalidades cometidas pela lei.

Referências

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1 Renata Salgado Leme, Universidade Santa Cecília (Unisanta); Possui graduação na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas pela Universidade de São Paulo (1987), Graduação em Direito na Universidade Católica de Santos (1992), Mestrado em Direito na Universidade de São Paulo (1998) e Doutorado em Direito na Universidade de São Paulo (2004). Atualmente é professora titular da Universidade Santa Cecília – UNISANTA, na Graduação da Faculdade de Direito e no Mestrado de Direito da Saúde

2 Advogada desde 2007; Possui graduação em Direito pela Universidade Norte do Paraná (2004), Pós Graduação em Direito Empresarial pela UEL – Universidade Estadual de Londrina – PR, Aperfeiçoamento em Mediação e Arbitragem, Mestranda em Direito da Saúde pela Universidade Santa Cecília (Unisanta). Tem experiência na área de Direito do Trabalho, com ênfase em Direito do Trabalho.

3 Advogado desde 2007, Formado na Unesa Estácio de Sá, Pós Graduação em Direito Público 2009, Universidade Gama Filho, Pós Graduação em Direito Médico em 2018, pela UFBA, Conselheiro jurídico da Anadem Sociedade Brasileira de Direito Médico, Mestrando pela Unisanta em Direito da Saúde.

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